Uma das imagens favoritas do apóstolo Paulo para a
igreja era a do corpo. Segundo
Shelley, é “a única metáfora do Novo Testamento sem qualquer base no Velho. O
apóstolo fez uso dela em Efésios, Colossenses, Romanos e 1 Coríntios”[1]. O
que se percebe nessas epístolas é que o apóstolo considerava o corpo em suas mais amplas dimensões
porque o viu unido a sua cabeça, Cristo. Paulo exortava os seus leitores a
perceberem que todos desfrutavam do privilégio de serem membros do corpo de
Cristo. Por isso, de forma explícita, escrevendo aos Coríntios, ele disse: “Ora,
vós sois corpo de Cristo; e, individualmente, membros desse corpo" (1 Co
12. 27). “Estas palavras foram proferidas com a finalidade de lembrar aos
crentes de Corinto que, através dessa imagem acerca da harmonia entre os
membros do corpo, foi ilustrada uma realidade espiritual”, que como escreveu
Champlin[2], a
saber, a realidade do corpo místico de Cristo, do qual todos os cristãos fazem
parte. Em relação a Cristo, eles eram um corpo, isto é, eles eram seu corpo
místico, sua expressão neste mundo, por serem aqueles que compartilham de sua
natureza. Cada qual é membro do outro, sendo mutuamente dependentes entre si.
Paulo não encarava cada comunidade como parte do corpo, antes, olhava para os
membros como aqueles que, individualmente, compunham, uma parte do corpo.
Quanto ao aspecto da individualidade, Calvino[3] dizia
que, “segundo cada qual tem tido sua porção e trabalho definido, que lhe tem
sido atribuído como um todo, falaria do corpo de Cristo como uma unidade.
Individualmente, fala dos membros como indivíduos”.
O sentido de igreja em Romanos e I Coríntios, acrescenta
Shelley, este era o alvo dos pensamentos de Paulo. E explica:
Seu ponto principal ao empregar a figura do corpo foi
de salientar a diversidade dos membros dentro da união do corpo, a igreja.
Romanos 12.4-5 resume melhor a idéia: ‘Porque, assim como num só corpo temos
muitos membros, mas nem todos os membros têm a mesma função; assim também nós,
conquanto muitos, somos um só corpo em Cristo, e membros uns dos outros’[4].
Com estas palavras, Paulo desenvolve a figura do
corpo de forma mais especifica. Uma analogia entre o corpo humano e a
comunidade cristã salienta que, embora sejam muitos os membros, os cristãos
fazem parte de um só corpo e, portanto, dependem uns dos outros. Essa doutrina
carrega implicações extraordinárias na maneira como se deve entender a igreja
local, principalmente no seu modo de agir.
Os cristãos devem trabalhar unidos e viver
harmoniosamente em prol do mesmo corpo. A figura do corpo propõe que essa união
dos crentes com Cristo é orgânica e, conseqüentemente, os relacionamentos entre
os irmãos devem objetivar esse elo com Cristo de forma recíproca. Se essa
dinâmica relacional não for uma realidade no relacionamento da igreja, ela
caminhará em constante desarmonia e conseguinte destruição. Assim, pode-se
concluir com Bavinck[5]
que “Cristo é a cabeça de todo o crente, de toda congregação, e também da
igreja como um todo”.
Escrevendo aos Colossenses, o apóstolo Paulo proferiu
as seguintes palavras: “Regozijo-me
agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o restante das aflições de
Cristo, pelo seu corpo, que é a
igreja” (Cl 1.24). Semelhantemente escreveu à igreja de Éfeso: “E sujeitou
todas as coisas a seus pés, e sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da
igreja, Que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos” (Ef.
1.22-23). Estes versos demonstram o favoritismo de Paulo em se referir à igreja
tanto de Colossos como a de Éfeso como o corpo
de Cristo. Paulo tinha um entendimento especial da igreja de Cristo, e este
era o sentido mais compreensivo e por meio do qual ele fazia referência direta
a todo o corpo dos fiéis.
Shelley[6]
ensina que o significado da metáfora da igreja como corpo de Cristo está relacionado ao “organismo que se acha unido a
Cristo”. Sendo assim, o corpo é mais do
que uma simples coleção de indivíduos. Trata-se de um organismo espiritual. Os
crentes em Cristo são unidos em seu corpo porque, mediante a regeneração, eles
se unem à cabeça que é Cristo.
Uma digna compreensão da igreja como organismo do modo como é apresentada nas
Escrituras é necessária para mudar a realidade atual vivida pelos crentes,
afirma Shelley[7], tornando-os
mais tolerantes em relação aos seus irmãos. A diversidade não é algo para ser
rejeitado. Deus quer que ela seja um meio de ministrar ao corpo e, por meio
deste, ao mundo. Cada membro é, pois, importante aos olhos de Deus.
Stedman afirma que
a igreja é principal e fundamentalmente um corpo
destinado a expressar através de cada membro, individualmente, a vida de um
Senhor que nele habite; e este corpo foi equipado pelo Espírito Santo com dons
que expressem esta vida. A conseqüência é que nada poderia ser mais improdutivo
ou patético do que uma igreja que não entende isso e, em vez disso, se utiliza
de métodos de negócio, processos organizacionais e pressão política mundana
para realizar o seu trabalho. Esta é uma receita certa para a frustração e a
morte final. Mas redescobrir o programa divino para a operação da igreja é um
desafio estimulante[8].
A igreja do presente precisa voltar os seus olhos para a Bíblia e
aprender a viver conforme o privilégio que Cristo lhe concedeu de ser o seu
corpo. Como concluiu Grudem, “a
metáfora da igreja como corpo de Cristo deve aumentar a nossa dependência mútua
e a nossa apreciação da diversidade de dons no corpo” [9].
[1] SHELLEY,
Bruce L. A Igreja: o povo de Deus,
p. 37.
[2]
CHAMPLIN.Russell Norman. O Novo
Testamento interpretado versículo por versículo, p. 199.
[3]
CALVINO apud CHAMPLIN. O Novo Testamento
interpretado versículo por versículo, p. 199.
[5]
BAVIINCK, Hermann. Teologia Sistemática,
p. 435.
[6] SHELLEY, Bruce L. Op. Cit., p. 37.
[7] Ibidem.
[8] STEDMAN.
Igreja Corpo de Cristo, p. 54.
[9] GRUDEM,
Wayne A. Teologia Sistemática, p. 20
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